3.12.08

Quase nada

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Sento-me e espero. Tenho a sensação de fazer isto recorrentemente. Cruzo a perna e sinto os pés gelados... um carro que passa, a chuva que cai e respinga nos vidros. Sinto-me dormente. E não consigo sair deste estado. É como se o corpo manifestasse algo muito diferente da vontade do meu cérebro. Mentira. Ultimamente, até o cérebro sinto dormente. Uma voz que fala e não me diz nada. Nada que me acorde, que me sacuda e espante este estado de dormência. Penso no que poderia acontecer para que um estado de espírito diferente tomasse lugar em mim. E é tão simples. Tão simples e, no entanto, tão vivamente inacessível.
Relembro. Lembro-me de outras fases em que tudo fluía e se sucedia naturalmente, sem esforços ou grandes provações. Quando era feliz e nem me dava conta do quão feliz era. “Como?” Aparentemente, a voz deu-se conta do meu alheamento. Sorrio e disfarço e penso no quanto gostaria de me interessar por aquele ser e o assunto abordado. Esforço inútil. Retiro-me. O meu cérebro volta a viajar logo após um comentário comprovativo da atenção que não presto a quem se me dirige.
Tenho saudades. Da facilidade com que me ria e de facto sentia esse riso nas entranhas. Parece que pouco ou nada me atinge. Entrei em estado de esperar sempre o pior. E pior ainda acontece.
Desejo ardentemente ser surpreendida. Mas já não só por um gesto. Por uma prolongada fase. Por um prolongado alguém. Por um constante sentimento. Pergunto-me porque os outros sentem e eu não. Ou melhor, porque os outros sentem tão diferentemente de mim. Ou, melhor ainda, porque não sinto eu como os outros. Perco-me em porquês. E eles amaldiçoam-me a alma, o espírito, o pensamento, o coração, o corpo.
A voz despede-se. Tem que se ir embora. Mas alguma vez ali esteve senão fisicamente? Levo a voz à porta, visto o meu sorriso e ergo a face para a despedida. Observo-a a ir. Acendo um cigarro e fico a ver o carro a afastar-se. Chove muito. Porque vesti este casaco hoje? Devia ter vestido o de cabedal para poder andar à chuva. Preciso... podia ser que me fizesse bem. Mas bem a quê? Sorrio do meu próprio disparate. Dou uma última passa no cigarro, apago-o e fecho a porta. Fico em pé a olhar para o nada.
A alma seguiu errante.

Por Shana Andrade

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