31.12.08

Passagem ...

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Atravessa as dimensões das esferas e chega de mansinho, sem ninguém por ele esperar. Na sua expectativa, enrosco-me e deixo-me levar esperando que ele tudo aligeire, apague e faça esquecer. Como um estado ébrio sem o ser. Como um cérebro perspicaz e nada atento. Como escrever sobre algo sem saber o quê. Como uma essência que não se capta, nem se entende, mas que se sente. Como uma facilidade na execução de uma tarefa, que em vez de alegrar, assusta.
Ele percorre o seu caminho impávido e sereno, implacável até, arrastando consigo memórias infindáveis, sentimentos fortes e marcas. Como quem tenta esquecer a olhar para uma foto. Como quem ri e quer chorar. Como quem dança sem corpo. Como quem ama sem perdoar. Como quem se lança num abismo preso por uma rede de segurança.
Segue o seu trilho e vem até mim, até nós e tenta esbater-nos com toda a calma, pois tempo é o seu nome e ele tem-no de sobra. Impaciência é palavra que não existe no seu vocabulário. Consequência do tempo é expressão que não existe no meu. Pois ele só atenua o que rejeito conscientemente. Não esbate e muito menos apaga.
Mais um ano que acaba. Outro que lhe sucede. E ele segue na sua marcha autónoma e irrecuperável sem se deter com nada. Se essa marcha é rápida ou lenta, fica ao critério de quem o sente passar, pois cada ser é um ser e cada percepção é muito de cada um.
A mim, assusta-me. Não pelo que foi ou pelo que é. Mas pelo que traz. É como um binóculo sem lentes. Como um oráculo que erra. Como um tarot mal interpretado. Como uma arte adivinhatória que se questionou a si mesma. Como um tudo que é um nada.
Mas, a ser optimista... um nada que possa vir a ser um tudo.
Ainda espero ... ainda quero ... ainda desejo ...

Shana Andrade

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